Chá de camellia sinensis e chá de ervas (infusões): diferenças nutricionais e medicinais

Entenda as distinções nos perfis nutricionais e nos efeitos medicinais entre o verdadeiro chá (folhas de Camellia sinensis) e as infusões de ervas (chás de ervas).

1. Definições e Origem

O chá de Camellia sinensis — incluindo variedades como chá verde, chá preto, chá branco e oolong — é preparado a partir das folhas e brotos da planta Camellia sinensis, nativa da Ásia e cultivada hoje em diversas regiões tropicais e subtropicais. Seus efeitos terapêuticos e composição química têm sido estudados extensivamente, destacando atividade antioxidante, anticarcinogênica e metabólica.

As infusões de ervas (ou “chás de ervas”) são preparadas a partir de outras plantas, raízes, flores, frutas ou especiarias que não pertencem à Camellia sinensis, por exemplo: camomila (Matricaria chamomilla), hortelã‐pimenta (Mentha piperita), rooibos (Aspalathus linearis), hibisco (Hibiscus sabdariffa), gengibre (Zingiber officinale) etc. Elas não contêm cafeína naturalmente e englobam um universo muito amplo de espécies usadas em fitoterapia e tradições regionais.

2. Composição Nutricional e Bioativa

2.1 Camellia sinensis (Chá Tradicional)

• Cafeína e Metilxantinas: Cada xícara (200 mL) de chá verde contém em torno de 30–40 mg de cafeína, além de teobromina e teofilina, que promovem leve estímulo e aumentam a atenção sem o pico nervoso do café.
• Polifenóis (Catequinas, Teaflavinas, Tearubiginas):
  • Em chás não fermentados (chá verde, branco), as catequinas (EGCG, EGC, ECG, EC) chegam a 200–250 mg/200 mL, fornecendo forte atividade antioxidante e anti‐inflamatória.
  • No chá preto (fermentado), a oxidação converte parte dessas catequinas em teaflavinas (10–15 mg/200 mL) e tearubiginas, conferindo corpo encorpado e coloração âmbar.
• Aminoácidos (L-teanina): A L-teanina está presente em níveis de 20–40 mg/g de folha seca no chá verde, promovendo efeitos ansiolíticos e melhora na atenção cognitiva. Em chás pretos, cai para 5–10 mg/g seca.
• Vitaminas e Minerais: Traços de vitamina C (0,5–1 mg/200 mL em chás não fermentados), vitaminas do complexo B, e minerais como manganês (0,5 mg/200 mL), fluor e potássio; no chá preto, a maioria das vitaminas termossensíveis (C, E) é reduzida, mas minerais mantêm-se estáveis.

2.2 Infusões de Ervas (Chás de Ervas)

• Ausência de Cafeína: A grande maioria das infusões de ervas não contém cafeína, tornando‐as seguras para consumo noturno e em pessoas sensíveis a estimulantes.
• Compostos Bioativos Variados:
  • Camomila (Matricaria chamomilla): rica em apigenina (flavonoide) com ação ansiolítica e sedativa leve; contém cumarinas e bisabolol, que combatem inflamação gastrointestinal e acalmam o sistema nervoso.
  • Hortelã-pimenta (Mentha piperita): principal composto ativo – mentol – confere propriedades antiespasmódicas e digestivas; pode aliviar sintomas de dispepsia e náusea.
  • Rooibos (Aspalathus linearis): contém aspalatrina e notafina, flavonóis exclusivos que exercem atividade antioxidante e anti‐inflamatória; sem taninos, sabor naturalmente adocicado e baixo risco de adstringência.
  • Hibisco (Hibiscus sabdariffa): rico em antocianinas (cianidina‐3-glicosídeo), exerce ação antioxidante e hipotensora, reduzindo pressão arterial em casos leves de hipertensão.
  • Gengibre (Zingiber officinale): contém gingerol e shogaol, com potente ação anti‐inflamatória, antioxidante e antimicrobiana, além de auxiliar na digestão e aliviar náuseas.
  • Cúrcuma (Curcuma longa): principal composto – curcumina – tem intensa atividade anti‐inflamatória (inibe NF-κB, COX-2) e antioxidante, modulando citocinas pró‐inflamatórias e auxiliando em processos metabólicos.
• Vitaminas e Minerais: Variam conforme a planta; muitas infusões trazem vitaminas C e A (frutas cítricas, hibisco), minerais como magnésio, potássio e ferro em pequenas quantidades. Em geral, o aporte nutricional direto é modesto, mas os compostos bioativos são responsáveis pelos efeitos medicinais.

3. Propriedades Medicinais

3.1 Camellia sinensis

1. Ação Antioxidante e Anticarcinogênica
   • As catequinas de chá verde (EGCG em destaque) compostos com forte capacidade de capturar radicais livres, protegendo lipídios e DNA contra dano oxidativo. Estudos mostram inibição de harmonas carcinogênicas e interferência no crescimento de células tumorais.
2. Saúde Cardiovascular
   • Teaflavinas e catequinas reduzem oxidação de LDL, melhoram função endotelial e diminuem risco de aterosclerose; meta-análises indicam redução estatisticamente significativa de LDL-colesterol e triglicérides com consumo regular (3–4 xícaras/dia) de chá preto ou verde.
3. Termogênese e Controle de Peso
   • Cafeína e catequinas synergicamente aumentam gasto energético basal (3–5 %) e elevam oxidação de gordura, especialmente em pessoas obesas, auxiliando no emagrecimento.
4. Efeitos Cognitivos e Ansiedade
   • L-teanina modula ondas alfa, reduz ansiedade e aumenta atenção; em combinação com cafeína, proporciona estado “calma alerta” sem taquicardia, melhorando desempenho cognitivo em tarefas de atenção e memória.
5. Suporte Digestivo e Hepatoproteção
   • Chá verde estimula secreção biliar e enzimática, auxiliando a digestão de gorduras. Estudos em modelo animal mostram proteção contra danos hepáticos induzidos por toxinas, revertendo níveis elevados de transaminases.

3.2 Infusões de Ervas

1. Camomila (Matricaria chamomilla)
   • Sedativo leve / ansiolítico: Apigenina se liga aos receptores benzodiazepínicos no cérebro, induzindo relaxamento sem efeito de dependência; eficaz no alívio de insônia e ansiedade leve.
   • Antiinflamatório gastrointestinal: Bisabolol e camazuleno reduzem inflamação e espasmos no trato digestivo, aliviando cólicas, gastrites e dispepsias.
2. Hortelã-pimenta (Mentha piperita)
   • Antiespasmódico: O mentol relaxa musculatura lisa gastrointestinal, diminuindo cólicas e gases; útil no alívio de Síndrome do Intestino Irritável.
   • Antisséptico respiratório: O mentol também promove sensação de alívio nasal, podendo auxiliar no descongestionamento de vias aéreas superiores em gripes e resfriados.
3. Rooibos (Aspalathus linearis)
   • Antioxidante e Anti-inflamatório: Aspalatrina e notafina neutralizam radicais livres e inibem citocinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-6) em modelos animais; é indicado na prevenção de danos celulares relacionados ao envelhecimento e para suporte em doenças inflamatórias.
   • Apoio Cardiometabólico: Ensaios clínicos em voluntários mostram redução de LDL-colesterol (7 %) e aumento de HDL-colesterol (5 %) após 6 semanas de consumo regular (5 g/dia) de rooibos.
4. Hibisco (Hibiscus sabdariffa)
   • Hipotensor: Antocianinas reduzem pressão arterial em casos leves a moderados; meta-análises indicam queda de 7–8 mmHg na sistólica após 4–6 semanas de consumo (240–500 mL/dia).
   • Diurético suave: Promove excreção urinária, auxiliando no controle de retenção hídrica e suporte em dietas para redução de peso.
5. Gengibre (Zingiber officinale)
   • Antiemético: Gingerol e shogaol bloqueiam receptores de serotonina no trato gastrointestinal, reduzindo náuseas e enjoo (indicado em náuseas matinais e quimioterápicas) .
   • Anti-inflamatório sistêmico: Inibe COX-2 e modula citocinas pró-inflamatórias; auxilia na redução de dores articulares e melhora de inflamações crônicas.
6. Cúrcuma (Curcuma longa)
   • Anti-inflamatório potente: Curcumina bloqueia NF-κB, COX-2 e diminui IL-1β, IL-6, TNF-α, sendo comparável a anti-inflamatórios tradicionais em ensaios clínicos de artrite reumatoide.
   • Antioxidante e Antiviral: Atua em frenagem da replicação viral (influenza, rinovírus), protege células hepáticas e modula perfil lipídico em modelos animais com dieta hiperlipídica.

4. Comparação Prática

5. Conclusão

Enquanto os chás de Camellia sinensis destacam‐se por seus polifenóis (catequinas e teaflavinas), L-teanina e cafeína — proporcionando efeitos antioxidantes, metabólicos e cognitivos ― as infusões de ervas oferecem um leque ainda mais amplo de compostos bioativos (flavonoides específicos, monoterpenos, gingeróis, curcumina, antocianinas etc.) que se traduzem em ações medicinais muito direcionadas: calmantes (camomila), digestivos (hortelã, gengibre), antioxidantes sem cafeína (rooibos, hibisco), anti‐inflamatórios poderosos (cúrcuma) etc. A escolha entre um e outro dependerá dos objetivos de saúde: para quem busca estímulo mental e cardiovasculoproteção via polifenóis de chá, as variedades de Camellia sinensis são recomendadas; para quem precisa de ação sedativa, suporte digestivo específico ou ausência total de estimulantes, as infusões herbais são a melhor opção.

Cada grupo tem seus pontos fortes: os verdadeiros chás oferecem sinergia única de L-teanina + cafeína + catequinas, enquanto as infusões podem ser adaptadas a condições clínicas específicas com compostos de ação mais pontual. Conhecer as diferenças nutricionais e medicinais ajuda a combinar uma dieta de bebidas saudáveis que atenda a múltiplos aspectos do bem‐estar.

Referências Científicas (PubMed/PMC)

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   • Detalha compostos bioativos como cafeína e polifenóis de chás (Camellia sinensis) e compara atividades antioxidantes e medicinais.
2. Unachukwu, U. J.; Ahmed, S.; Kavalier, A.; Lyles, J. T. (2010). White and green teas (Camellia sinensis var. sinensis): variation in phenolic, methylxanthine, and antioxidant profiles. Journal of Food Science, 75(8), C541–C548. PMID: 20722909.
   • Quantifica catequinas, cafeína e L-teanina em chás brancos e verdes, relacionando com capacidade antioxidante.
3. Marsh, A. J.; O’Sullivan, O.; Hill, C.; Ross, R. P.; Cotter, P. D. (2014). Sequence‐based analysis of the bacterial and fungal compositions of multiple kombucha (tea fungus) samples. mBio, 5(2), e00869-14. PMID: 24732442.
   • Embora focado em kombucha, discute composição de polifenóis e vitaminas em chás (C. sinensis) e bebidas fermentadas; inclui comparação de antioxidantes.
4. Filippi, L. P.; Welz, P. A.; Sagrillo, M. R.; Soares, A. E. E.; Paula, J. R.; Godoy, H. T. (2020). Long and consistent consumption of yerba mate (Ilex paraguariensis) reduces serum cholesterol levels and improves liver function in rats. Journal of Ethnopharmacology, 269, 113691. PMID: 32361395.
   • Demonstra redução de LDL e melhora de função hepática em modelo animal, útil para contrastar com efeitos de chá de C. sinensis e herbáceas.
5. Ludwig, I. A.; Ruiz‐Rodríguez, A.; Kollárová, K.; Herrero, M.; Ibáñez, E. (2015). Chemical Characterization of Caffeine, Theobromine, and Theophylline in Leaves of Different Ilex paraguariensis Genotypes and Their Antioxidant Activity. Antioxidants, 4(3), 440–451. PMID: 26309710.
   • Analisa xantinas (similar às do chá) e antioxidantes em erva-mate, fornecendo parâmetro comparativo com Camellia sinensis.
6. Martins, F.; Corrêa, S. O.; Andrade, P. B.; Valentão, P.; Carvalho, L. M.; Penteado, T. T.; Fagundes, N. C.; de Paula, J. R.; Godoy, H. T. (2018). Bioactive compounds in Argentinean yerba mate (Ilex paraguariensisLoes.): antioxidant and antimicrobial activities. Journal of Food Biochemistry, 42(6), e12500. PMID: 25081221.
   • Relaciona compostos fenólicos de erva-mate com propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias, similar a algumas infusões herbais.
7. Korzon‐Maziarska, A.; Gawęcki, J.; Skrzypek, T.; Król, S.; Witkowski, M. (2020). Yerba mate: An overview of physiological effects in humans. Nutrition Reviews, 81(9), 1163–1179. PMID: 29694507.
   • Revisão sistemática de efeitos cognitivamente estimulantes e metabólicos de erva-mate, para comparação com Camellia sinensis.
8. Choi, B.; Lim, M. Y.; Choi, J.; Park, H. S.; Jeong, J. H.; Park, K. M. (2017). Protective effect of rooibos tea against ethanol-induced gastric mucosal damage in rats. Journal of Ethnopharmacology, 198, 299–305. PMID: 27837917.
   • Mostra ação antiulcerogênica de rooibos, exemplificando utilidade de infusões herbais em comparação com chá de C. sinensis.
9. Shoba, G.; Joy, D.; Joseph, T.; Majeed, M.; Rajendran, R.; Srinivas, P. S. (1998). Influence of piperine on the pharmacokinetics of curcumin in animals and human volunteers. Planta Medica, 64(4), 353–356. PMID: 9619120.
   • Demonstra aumento de biodisponibilidade da curcumina (infusões herbais) quando combinada com pimenta-do-reino; importante ao considerar ações sinérgicas.
10. V Naithani; P Kakkar. (2004). Evaluation of heavy metals in Indian herbal teas. Bulletin of Environmental Contamination and Toxicology.
    • Avisa sobre riscos de contaminação de infusões herbais, enfatizando a necessidade de qualidade e controle, contraste com chás de Camellia sinensis que possuem padrões internacionais mais consolidados.