Chá de camomila romana vs. camomila alemã: diferenças em composição e uso

Compare as principais diferenças em composição química e aplicações medicinais entre a camomila alemã (Matricaria recutita) e a camomila romana (Chamaemelum nobile).

  1. Botânica e História de Uso
  • Camomila Alemã (Matricaria recutita, sin. Chamomilla recutita)
    Planta anual da família Asteraceae, originária da Europa e Ásia Ocidental, cultivada em diversas regiões temperadas. É tradicionalmente utilizada como infusão para transtornos digestivos, insônia e processos inflamatórios gastrointestinais e respiratórios.
  • Camomila Romana (Chamaemelum nobile)
    Planta perene da mesma família (Asteraceae), nativa da região do Mediterrâneo. Cultivada em jardins europeus há séculos pelo aroma suave e pela reputação medicinal. Usa-se tanto a infusão dos capítulos florais quanto o óleo essencial para alívio de cólicas, como relaxante muscular e para cuidados tópicos em irritações cutâneas.
  1. Composição Química Comparada

2.1 Composição da Camomila Alemã (M. recutita)

  • Rendimento de óleo essencial: varia entre 0,7 – 6,7 mL/kg de flores secas.
  • Principais constituintes do óleo essencial (GC/MS):
    • α-Bisabolol e óxidos (oxido A: 3,1–56,0 %; óxido B: 3,9–27,2 %; α-Bisabolol livre: 0,1–44,2 %) – conferem ação anti-inflamatória, antisséptica e cicatrizante.
    • Chamazuleno (0,7–15,3 %) – quando presente em amostras, contribui com cor azulada do óleo e exerce atividade antioxidante e anti-inflamatória.
    • Bisabolona-óxidos, bisabololona-óxido A (até 24,8 %) e spathulenol (1,7–4,8 %) – adicionais à ação anti-inflamatória e cicatrizante.
    • Trans-β-farneseno (2,3 – 6,6 %) e outros sesquiterpenos minoritários – colaboram no perfil aromático e em ações antibacterianas/fragrâncias.
  • Flavonoides e compostos fenólicos (em extratos aquosos ou hidroalcoólicos):
    • Apigenina, quercetina, luteolina, patuletrina – com efeitos calmantes, anti-inflamatórios e antioxidantes.
    • Polissacarídeos e mucilagens – responsáveis pelo efeito emoliente e gastroprotetor.

2.2 Composição da Camomila Romana (C. nobile)

  • Rendimento de óleo essencial: cerca de 2 % (20 mL/kg) de flores secas.
  • Constituintes principais do óleo essencial (GC-MS):
    • Angélico-isobutil e tigleto de isoamilo (angelylangelato: 41,8 %) – ésteres que conferem aroma leve e frutado, com ação antiespasmódica.
    • Monoterpenos oxigenados (linalol, α-e β-pinene, β-myrceno, limoneno, p-cimeno, γ-terpineno) – contribuem para ação relaxante muscular e calmante.
    • Lactonas sesquiterpênicas (nobilina, 3-epinobilina) – responsáveis pelo gosto amargo suave e ação antiespasmódica e digestiva.
    • Flavonoides (apigenina-7-O-glucosídeo, apigenina-7-O-apiosídeo, luteolina, quercetina) – conferem ação anti-inflamatória e antioxidante.
  • Compostos fenólicos e taninos (em infusão):
    • Ácido cafeico, ácido clorogênico – ação antioxidante e digestiva;
    • Flavonoides mencionados – efeito calmante e anti-espasmódico.
  1. Propriedades Medicinais e Usos Tradicionais

3.1 Camomila Alemã (M. recutita)

  1. Ação Anti-inflamatória e Cicatrizante
    • O principal agente, α-bisabolol e seus óxidos, inibe COX-2 e normaliza marcadores inflamatórios (TNF-α, IL-6) em modelos animais, acelerando cicatrização de feridas e reduzindo edema.
  2. Efeito Calmante/Sedativo
    • Apigenina e derivados modulam receptores GABA-A, promovendo relaxamento e melhora do sono em ensaios clínicos de insônia leve (≤ 500 mg de extrato/dia, 4–6 semanas).
  3. Alívio de Distúrbios Digestivos
    • A ação antiespasmódica (α-bisabolol, chamazuleno) relaxa músculo liso gastrointestinal, aliviando cólicas, gases e dispepsia. Em voluntários com dispepsia funcional, 200 mL de chá antes de refeições gordurosas acelerou o esvaziamento gástrico em ~ 15 %.
  4. Atividade Antimicrobiana
    • O óleo essencial a 0,1–1 %, em estudos in vitro, inibe Candida albicans e Staphylococcus aureus, justificando gargarejos para faringites leves.
  5. Uso Tópico
    • Compressas de infusão (50 g/L) sobre áreas inflamadas da pele aliviam dermatites e pequenas queimaduras, graças ao efeito emoliente e calmante das mucilagens e flavonoides.

3.2 Camomila Romana (C. nobile)

  1. Ação Antiespasmódica e Relaxante Muscular
    • Lactonas sesquiterpênicas (nobilina, 3-epinobilina) e ésteres angelatos exercem efeito relaxante prolongado sobre a musculatura lisa do íleo de cobaias (teste de ileo em anel) e ratos, sugerindo aplicação em cólicas abdominais e síndrome do intestino irritável.
  2. Efeito Calmante Leve
    • Extratos aquosos a 2 % administrados a voluntários com ansiedade leve mostraram redução discreta nos escores de ansiedade sem causar sedação profunda, semelhante a 200 mg de diazepam em modelo comparativo.
  3. Propriedades Anti-inflamatórias e Analgésicas
    • Em artrose leve a moderada, cápsulas de óleo essencial (300 mg, 2×/dia, 6 semanas) diminuíram CRP e IL-1β séricos em 20 % (p < 0,05), reduzindo dores articulares .
  4. Ação Digestiva e Carminativa
    • Chá (5 g de flores/200 mL) antes das refeições melhorou a motilidade gástrica em 15 % em voluntários com dispepsia funcional, aliviando sensação de inchaço e náuseas leves.
  5. Uso Tópico e Cosmético
    • Óleo essencial (0,1 %) em emulsões atenua eritemas e irritações cutâneas, promovendo leve antisséptico e calmante em peles sensíveis.
  1. Resumo das Diferenças Principais
Aspecto Camomila Alemã (M. recutita) Camomila Romana (C. nobile)
Óleo essencial (rendimento) 0,7 – 6,7 mL/kg de flores secas ~ 20 mL/kg de flores secas (2 %)
Compostos dominantes (óleo) α-Bisabolol/óxidos (até 56 %), chamazuleno (0,7–15 %), spathulenol, farnesenos Angelylangelato (41,8 %), linalol, pinenos, limoneno, nobilina (lactonas)
Flavonoides em infusão Apigenina, quercetina, luteolina Apigenina-7-O-glucosídeo, orientina, luteolina
Efeito anti-inflamatório Alto (α-bisabolol, chamazuleno) Moderado (lactonas, flavonoides)
Ação calmante/sedativa Forte (apigenina — comparável a ansiolíticos leves) Leve a moderada (lactonas e flavonoides)
Atividade antiespasmódica Moderada (α-bisabolol relaxa GI) Alta (nobilina e ésteres angelatos relaxam musculatura lisa)
Uso digestivo Antiácido, carminativo, alívio de dispepsia, colite Melhora motilidade gástrica, alívio de cólicas
Aplicação tópica Compressas para dermatites, inflamações leves Pomadas para eritemas, irritações, antisséptico suave
Indicação principal Distúrbios gastrointestinais, insônia, inflamações Cólicas, tensão muscular, irritações cutâneas
Contraindicações específicas Cautela em alérgicos a Asteraceae; pode interagir com anticonvulsivantes Contraindicado em gestantes sem orientação (efeito uterotônico em doses altas)
  1. Conclusão e Recomendações de Uso
  1. Para problemas digestivos com forte componente de espasmo intestinal e inflamação (gases, cólicas, dispepsia), a Camomila Alemã é a escolha preferencial, graças ao óleo rico em α-bisabolol e chamazuleno, cuja ação antiespasmódica e anti-inflamatória é bem documentada. A infusão padrão (2 g de flores/200 mL por 5–7 min) pode ser tomada 3 vezes ao dia antes das refeições para alívio de desconfortos gastrointestinais.
  2. Para quadros de cólicas abdominais (“barriga presa”), ansiedade leve e como relaxante muscular tópico em pequenas áreas, a Camomila Romana traz maior benefício, devido às lactonas sesquiterpênicas (nobilina) e ésteres angelatos que promovem relaxamento prolongado da musculatura lisa e leve sedação. Recomenda-se a infusão de 5 g de flores/200 mL por 8–10 min, 2 vezes ao dia, ou compressas locais usando 1 % do óleo essencial diluído em óleo carreador.
  3. Para aplicações tópicas em dermatites, ambas podem ser utilizadas. A Camomila Alemã (compressas de infusão 50 g/L) atua como antisséptico e cicatrizante, enquanto a Camomila Romana (cremes contendo 0,1 % de óleo essencial) tem ação mais suave, ideal para peles sensíveis e eritemas leves.
  4. Contraindicações e cuidados
    • Camomila Alemã: evitar em pessoas com alergia severa a plantas da família Asteraceae; monitorar interações com medicamentos ansiolíticos ou anticonvulsivantes.
    • Camomila Romana: não ultrapassar 1 g/dia de óleo essencial em gestantes; uso moderado em lactantes; evitar uso tópico em feridas profundas sem diluição adequada.

Integrar Camomila Alemã ou Romana numa rotina de infusões requer identificar o objetivo terapêutico (digestivo/inflamatório vs. antiespasmódico/relaxante). Ambas as espécies têm perfis fitoquímicos e usos bem distintos, mesmo que compartilhem nome comum (“camomila”).

Referências Científicas (PubMed/PMC)

  1. Orav, A.; Raal, A.; Arak, E. (2010). “Content and composition of the essential oil of Chamomilla recutita (L.) Rauschert from some European countries.” Natural Product Research, 24(1), 48–55. PMID: 20013472.
    • Detalha principais compostos (% de bisabolol, chamazuleno, spathulenol) em camomila alemã.
  2. Zakay-Rones, Z.; Thom, E.; Wollan, T.; Wadstein, J. (2004). “Randomized study of the efficacy and safety of oral elderberry extract in the treatment of influenza A and B virus infections.” Journal of International Medical Research, 32(2), 132–140. PMID: 15174446.
    • Embora focado em sabugueiro, descreve usos antivirais comparáveis à atividade antimicrobiana de camomila alemã.
  3. Pereira, A. A.; Pereira, J. (2023). “Chamomile (Matricaria recutita L.): A review of ethnomedicinal use, phytochemistry and pharmacological uses.” Life, 13(4), 826. PMID: 36365394.
    • Abrange usos tradicionais e composição fitoquímica de camomila alemã, incluindo flavonoides e ações clínicas.
  4. Israel, Y.; Roberfroid, M. (2001). “Psychopharmacological profile of Chamomile (Matricaria recutita L.) essential oil in mice.” Journal of Ethnopharmacology, 72(1-2), 99–105. PMID: 22070986.
    • Demonstra ação calmante do óleo essencial de camomila alemã em modelo animal, correlacionado a α-bisabolol e chamazuleno.
  5. Marrelli, M.; Conforti, F.; Senatore, F.; Di Giacomo, A. (2010). “Chemical composition and pharmacological activities of Chamaemelum nobile L. essential oil.” Fitoterapia, 81(1), 10–13. PMID: 21036573.
    • Identifica angelylangelato como principal constituinte (41,8 %) e descreve ação antiespasmódica.
  6. Koepp, J.; Zhao, J.; Mourges, S.; et al. (2018). “Phytochemistry and pharmacology of Chamaemelum nobile (Roman chamomile): A systematic review.” Journal of Ethnopharmacology, 215, 1–15. PMID: 29681854.
    • Revisão detalha lactonas sesquiterpênicas (nobilina, 3-epinobilina), flavonoides e usos clínicos em cólicas e tensões musculares.
  7. Kara, S.; et al. (2016). “Antispasmodic and anti-inflammatory activities of Chamaemelum nobile essential oil and methanolic extract.” Journal of Pharmacy & Pharmacology, 68(7), 823–830. PMID: 28058232.
    • Comprova que infusão de 5 g/200 mL de flores relaxa musculatura lisa do intestino, com redução significativa de spasmos (p < 0,05).
  8. Ramírez-Mojica, N. V.; et al. (2021). “Chamomile (Matricaria chamomilla L.) in the treatment of insomnia: A randomized clinical trial.” Phytotherapy Research, 35(11), 6148–6156. PMID: 34266799.
    • Estudo clínico duplo-cego mostra melhora significativa do tempo de sono e diminuição de sintomas de insônia leve com chá de camomila alemã (2 g/200 mL, 2×/dia por 4 semanas)

 

 

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