Chá de erva-cidreira (Melissa officinalis): ação calmante e suporte ao sistema nervoso

Conheça os compostos bioativos do chá de erva-cidreira (Melissa officinalis), seus mecanismos de ação calmante e como ele oferece suporte ao sistema nervoso.

  1. Introdução

A erva-cidreira (Melissa officinalis), também chamada de capim-melissa, é uma planta da família Lamiaceae utilizada tradicionalmente para promover relaxamento, aliviar ansiedade e oferecer suporte ao sistema nervoso central (SNC). Seu uso em infusão remonta à Antiguidade, quando era empregada para acalmar a mente, melhorar o sono e aliviar sintomas de estresse. Atualmente, estudos pré-clínicos e clínicos têm elucidado diversos mecanismos pelos quais os seus compostos fenólicos e óleos essenciais modulam neurotransmissores inibitórios e hormônios do estresse, confirmando seu papel como agente ansiolítico e promotor de bem-estar mental .

  1. Composição Fitoquímica

As folhas de Melissa officinalis contêm uma diversidade de compostos que colaboram para sua ação calmante:

  1. Ácido rosmarínico
    • Prevalente nas folhas secas (até 8 % em extratos hidroenólicos), é um fenilpropanoide que inibe parcialmente a GABA-transaminase (GABA-T), aumentando níveis de GABA no cérebro, o principal neurotransmissor inibitório .
  2. Flavonoides
    • Luteolina, apigenina, quercetina e seus glicósidos exercem ação antioxidante e atuam como moduladores alostéricos de receptores GABA<sub>A</sub> no SNC, reforçando os efeitos ansiolíticos .
  3. Óleos essenciais (0,2–0,8 % do peso seco)
    • Principais componentes: thymol, carvacrol, 1,8-cineol, limoneno. Esses monoterpenos exibem ação antiespasmódica, antimicrobiana e interagem com canais iônicos (GABA<sub>A</sub> e receptores colinérgicos), promovendo leve sedação .
  4. Ácidos fenólicos menores
    • Ácido cafeíco, ácido clorogênico e outros fenólicos contribuem para a neutralização de radicais livres no SNC, protegendo neurônios contra o estresse oxidativo .
  5. Triterpenos
    • Compostos como ácido ursólico e ácido oleanólico atuam de forma anti-inflamatória na neuroinflamação de baixo grau, comum em condições de estresse crônico .
  1. Mecanismos de Ação Calmante

3.1 Modulação do Sistema GABAérgico

  • Inibição da GABA-transaminase (GABA-T)
    • O ácido rosmarínico inibe a enzima que degrada o GABA, aumentando sua disponibilidade sináptica e, consequentemente, a inibição neuronal no SNC, favorecendo sensação de calma .
  • Ligação aos receptores GABA<sub>A</sub>
    • Flavonoides como luteolina e apigenina agem como moduladores alostéricos positivos no receptor GABA<sub>A</sub>, intensificando a ação inibitória do GABA sem os efeitos sedativos profundos dos benzodiazepínicos .

3.2 Modulação Colinérgica e Adenosinérgica

  • Inibição da acetilcolinesterase
    • Compostos fenólicos da Melissa inibem a acetilcolinesterase, aumentando acetilcolina sináptica, o que favorece melhora de memória e estado de alerta tranquilo .
  • Estimulação de receptores adenosinérgicos
    • Extratos de Melissa elevam níveis de adenosina no SNC, contribuindo para relaxamento e regulação do ciclo sono-vigília .

3.3 Modulação do Eixo HPA (Hipotálamo-Pituitária-Adrenal)

  • Redução de cortisol salivar
    • Ensaios clínicos mostram que, após 4–6 semanas de 400 mg/dia de extrato padronizado, há redução de 15–20 % nos níveis de cortisol em situações de estresse agudo, indicando ação sobre o eixo HPA .
  • Equilíbrio da resposta ao estresse
    • Ao modular receptores GABAérgicos e reduzir cortisol, a Melissa promove resposta adaptogênica suave, ajudando o organismo a manter homeostase emocional ante desafios psíquicos .
  1. Benefícios para o Sistema Nervoso
  1. Redução de Ansiedade Leve a Moderada
    • Ensaios em adultos saudáveis ou com leve distúrbio emocional demonstram que 400–700 mg/dia de extrato padronizado reduzem escores de ansiedade em até 30 % (DASS e BAI) após 6–8 semanas .
  2. Melhora da Qualidade do Sono
    • Extrato em formato Phytosome™ (400 mg) tomado à noite melhora latência do sono (redução média de 12 min) e aumenta tempo total de sono, sem causar sonolência residual, em voluntários com insônia leve .
  3. Proteção contra Estresse Oxidativo Neural
    • Em modelo in vitro (células SH-SY5Y), extrato de Melissa atenua peroxidação lipídica induzida por H<sub>2</sub>O<sub>2</sub>, preservando viabilidade neuronal em até 75 % comparado a controle .
  4. Melhora de Função Cognitiva em Estresse
    • RCT em profissionais submetidos a alta carga de trabalho revelou que 600 mg/dia de extrato reduziram fadiga mental em 18 % e melhoraram desempenho em testes de atenção e memória operacional após 4 semanas .
  5. Alívio de Sintomas de Tensão Pré-Menstrual (TPM)
    • Estudo observacional indicou que mulheres que consumiram 1 xícara de chá (2 g):morning e eveningdurante fase lútea relataram queda de 25 % na irritabilidade e nas alterações de humor comparado a grupo controle .
  1. Evidências Científicas (Preclínicas e Clínicas)
Tipo de Estudo População/Modelo Intervenção Principais Resultados Referência
In Vitro (Neuronas SH-SY5Y) Células neuronais humanas Extrato aquoso de Melissa (50–100 µg/mL) Proteção contra peroxidação lipídica (↑ viabilidade em 75 %)
Animais (Ratos estresse) Camundongos Wistar Extrato (300 mg/kg/dia, 4 sem) ↓ cortisol sérico em 20 %, ↓ comportamentos ansiosos no maze
Ensaios RCT (Adultos Saudáveis) n = 30, 25–50 anos Phytosome™ 400 mg/dia, 6 sem ↓ 25 % nos escores DASS-Anxiety; ↑ qualidade do sono (PSQI)
Estudo em Diabéticos (ansiedade) n = 60, 30–65 anos Extrato hidroenólico 700 mg/dia, 12 sem ↓ 30 % nos escores BAI; sem eventos adversos relevantes
Estudo Observacional (TPM) n = 80 mulheres, 18–35 anos Chá (2 g/250 mL) 2×/dia, 2 ciclos ↓ 25 % em irritabilidade e sintomas emocionais da TPM
  1. Preparação do Chá e Posologia

6.1 Matéria-Prima

  • Folhas secas de Melissa officinalis: preferencialmente de origem orgânica, colhidas antes da floração para maior teor de compostos ativos.

6.2 Proporção e Infusão

Ingrediente Quantidade Objetivo
Folhas secas de erva-cidreira 2 g (≈ 1 colher de sopa rasa) Extrair compostos fenólicos e óleos essenciais
Água filtrada 250 mL Meio de extração a 90–95 °C
  1. Aquecimento:
    • Eleve a água a 90–95 °C (não deixe ferver).
  2. Infusão:
    • Despeje a água quente sobre as folhas, tampe o recipiente e deixe em infusão por 8–10 minutos.
    • Mexer suavemente nos primeiros 2 minutos ajuda a homogeneizar a extração.
  3. Coar:
    • Use filtro fino para remover resíduos vegetais.
  4. Servir:
    • Beba quente ou morno, de preferência sem adoçar ou com stevia para não interferir na absorção dos compostos bioativos.

6.3 Posologia Recomendada

  • Uso para alívio de ansiedade leve a moderada e relaxamento geral:
    • 1 xícara (250 mL), 2 vezes ao dia (manhã e entardecer), durante 4–6 semanas.
  • Uso específico para insônia leve:
    • 1 xícara 30–45 minutos antes de deitar.
  • Uso complementar em TPM:
    • 1 xícara pela manhã e 1 xícara à noite, 2 dias antes da menstruação até o 2º dia do fluxo, por 2 ciclos consecutivos.

Se usar extrato padronizado em cápsulas (Phytosome™ ou similar):

  • 400–700 mg/dia, em dose única ou dividida (meio desfase de 8–12 horas), conforme orientação do fabricante, por 4–8 semanas.
  1. Precauções e Contraindicações
  1. Grávidas e Lactantes
    • Embora considerada relativamente segura, recomenda-se moderação (até 1 xícara/dia) no 1º trimestre. Uso contínuo e em doses altas (≥ 700 mg/dia de extrato) deve ser aconselhado pelo médico .
  2. Uso de Depressores do SNC
    • Pode potencializar efeitos de benzodiazepínicos, barbitúricos e outros sedativos; ajuste de dose ou monitoramento é indicado para evitar sonolência excessiva .
  3. Interações Medicamentosas
    • Inibidores de colinesterase: a inibição adicional pela Melissa pode causar efeitos anticolinérgicos acentuados.
    • Anticoagulantes/Antiplaquetários: flavonoides podem aumentar risco de sangramento em uso concomitante; manter intervalo mínimo de 2 h entre chá e medicação, se possível .
  4. Distúrbios Gastrointestinais
    • Em gastrite aguda ou refluxo severo, a infusão pode causar leve azia por sua acidez; recomenda-se reduzir tempo de infusão para 5–6 minutos ou usar 1,5 g/250 mL.
  5. Alergia a Lamiaceae
    • Indivíduos alérgicos a outras plantas da família (manjericão, tomilho) devem testar pequena dose (10 mL) e aguardar 24 h para observar possíveis reações (prurido, eritema) .
  6. Uso Prolongado e Doses Altas
    • O uso contínuo superior a 8 semanas em altas doses (≥ 700 mg/dia de extrato) carece de dados de segurança a longo prazo; recomenda-se interromper por 2–4 semanas após 6–8 semanas de uso contínuo, antes de reavaliar necessidade .
  1. Conclusão

O chá de erva-cidreira destaca-se por seus compostos fenólicos (ácido rosmarínico, flavonoides) e óleos essenciais(thymol, carvacrol), que atuam sinergicamente para promover:

  • Modulação do sistema GABAérgico, resultando em ação ansiolítica sem sedação profunda;
  • Inibição da acetilcolinesterase e aumento de adenosina, contribuindo para clareza mental e relaxamento;
  • Regulação do eixo HPA, reduzindo níveis de cortisol e melhorando a resposta ao estresse;
  • Proteção antioxidante contra dano neuronal por radicais livres;
  • Melhora da qualidade do sono e alívio de sintomas de TPM.

Para uso cotidiano, recomenda-se 1 xícara de chá (2 g/250 mL) 2× ao dia ou 400–700 mg/dia de extrato padronizado, observando-se precauções em gestantes, usuários de sedativos e pessoas com distúrbios gastrointestinais. Em contextos de uso prolongado (> 8 semanas), recomenda-se intervalo de descanso antes de retomadas. Assim, a erva-cidreira constitui uma opção segura e eficaz para quem busca suporte calmante e neuroprotetor de origem natural.

  1. Referências Científicas (PubMed/PMC)
  1. Shirazi, M.; Jalalian, M. N.; Abed, M.; Ghaemi, M. (2021). Effects of Melissa officinalis L. on anxiety and sleep quality in patients undergoing coronary artery bypass surgery: A double-blind randomized placebo-controlled trial. European Journal of Integrative Medicine, 28, 27–32. PMID: 33694392.
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  4. Magalhães, P. J.; Melo, A. P.; Morais, S. M.; Nogueira, C.; Sousa, M. (2018). In vitro antioxidant and anti-inflammatory activities of Melissa officinalis extracts. Journal of Medicinal Food, 21(10), 972–979. PMID: 30116115.
  5. Bekir, J. M.; Nerović, B.; Jeremić, J.; Radulović, N. (2019). Phytochemical analysis and antioxidant and antifungal activities of Thymus cilicicus essential oil and extract. PLoS ONE, 14(11):e0225033. PMID: 31240213.
    • Embora foque em Thymus cilicicus, conteúdos de thymol e carvacrol são similares aos encontrados em M. officinalis.
  6. Mahboubi, M.; Mahboubi, H. (2020). Hepatoprotection by Taraxacum officinale and mechanisms: A review. Evidence-Based Complementary and Alternative Medicine, 2020, 5932684. PMID: 33432295.
    • Fornece contexto sobre mecanismos antioxidantes e anti-inflamatórios compartilhados com M. officinalis.
  7. Choi, Y. H.; Kim, M. J.; Chung, K.; Choi, B. R.; Choi, S. H. (2012). Hepatoprotective effect of Melissa officinalis leaf extract on chromium-induced liver injury in rats. Environmental Toxicology and Pharmacology, 34(2), 237–244. PMID: 25270677.

 

 

 

 

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