Chá de rooibos (chá vermelho da África do Sul): cultivo, sabor e usos terapêuticos

Conheça a história, as condições ideais de cultivo, o perfil sensorial e os principais usos terapêuticos do chá de rooibos, nativo da África do Sul.

  1. Origem e Cultivo

1.1 Planta e Região de Cultivo

  • Rooibos (Aspalathus linearis) é um arbusto leguminoso endêmico das montanhas Cederberg, na província do Cabo Ocidental, África do Sul. As condições climáticas são características:
    • Clima mediterrâneo: verões quentes e secos, invernos frios e úmidos.
    • Solo ácido e pobre em nutrientes: drenagem rápida é essencial; o rooibos se adaptou ao solo arenoso e ácido (pH 4,5–6,0).
  • Hoje, quase toda a produção mundial de rooibos ocorre nessa região, com plantações em altitudes entre 200 e 500 metros acima do nível do mar .

1.2 Manejo Agrícola

  1. Plantio e Propagação
    • Propaga-se por sementes ou estaquia para manter características desejáveis (produtividade e resistência seca).
    • As mudas são plantadas no início do inverno, quando a umidade do solo é mais estável.
  2. Poda e Colheita
    • Arbustos adultos (3–5 anos) são podados anualmente após a estação de chuvas (outubro–dezembro), cortando-se quase até o solo para estimular brotação vigorosa.
    • Colheita manual: em torno de janeiro a março, cortam toda a parte aérea. Evita-se uso de máquinas por conta do relevo acidentado.
  3. Processamento (Fermentação “Semi-Fermentation”)
    • Após a colheita, as ramagens com folhas verdes são picadas e deixadas em pilhas para iniciar a fermentação oxidativa, que dura de 6 a 10 horas, transformando os pigmentos em cor avermelhada característica.
    • Em seguida, as folhas são secas em estufas a cerca de 60–80 °C até alcançar teor de umidade de 5–6 %, parando a fermentação e preservando compostos bioativos .
  1. Perfil de Sabor e Composição Química

2.1 Sabor e Aroma

  • Cor: infusão avermelhada a marrom-alaranjada intensa.
  • Aroma: notas suaves, terrosas, levemente adocicadas, lembrando mel ou baunilha natural.
  • Sabor: doce naturalmente, sem amargor nem adstringência, com leve sensação herbácea. A falta de taninos pronunciados torna o rooibos adequado para consumo puro ou com adições (mel, limão) sem ficar amargo .

2.2 Composição Fenólica e Compostos Funcionais

  1. Polifenóis Específicos
    • Aspalatrina e Nótanina: compostos exclusivos do rooibos, responsáveis por parte de sua atividade antioxidante e pela coloração avermelhada após fermentação.
    • Quercetina, Rutin, Luteolina: flavonóis encontrados em quantidades moderadas, conferindo propriedades antioxidantes.
    • Ácido Cítrico, Ácido Málico: contribuem com leve acidez natural, equilibrando a doçura.
  2. Antioxidantes
    • Concentram até 200 mg de equivalentes de ácido gálico (GAE)/200 mL em infusão fermentada, valor comparável a chás puros, embora o perfil seja distinto (alta atividade de superóxido dismutase-like, baixa de DPPH comparado a chá verde) .
  3. Minerais e Vitaminas
    • Fornece flúor (0,05–0,10 mg/200 mL), manganês (0,3 mg/200 mL) e ferro (0,02 mg/200 mL). Traços de vitamina C podem estar presentes devido à fermentação leve, mas geralmente as vitaminas do complexo B são insignificantes após processamento térmico .
  1. Usos Terapêuticos e Benefícios à Saúde

3.1 Ação Antioxidante

  • Mecanismos: Aspalatrina, notanina e flavonóis atuam na neutralização de radicais livres. Em estudo in vitro, extrato de rooibos reduziu malondialdeído (MDA) em linhagens celulares de hepatócitos, sugerindo potencial hepatoprotetor .

3.2 Propriedades Anti-inflamatórias e Cardiovasculares

  • Inflamação: Em modelo murino, suplementação com rooibos (2 % na dieta) por 4 semanas reduziu citoquinas pró-inflamatórias (TNF-α, IL-6) em circulação, comparado a grupo controle .
  • Perfil lipídico: Em ensaio clínico com 30 voluntários saudáveis que consumiram 5 g de rooibos/dia por 6 semanas, houve redução de LDL-c em 7 % e aumento de HDL-c em 5 % (PMID: 21499267) .

3.3 Efeito Antidiabético e Metabólico

  • Sensibilidade à insulina: Em ratos com obesidade induzida por dieta rica em gordura, rooibos reduziu níveis de glicemia de jejum em 12 % e melhorou resposta ao teste de tolerância à glicose em 15 %, potencialmente via modulação de GLUT4 no músculo esquelético .
  • Atividade termogênica: Alguns estudos indicam que compostos do rooibos podem incentivar leve aumento no gasto energético em repouso, mas evidências em humanos são ainda preliminares (PMID: 23486223) .

3.4 Saúde Óssea e Neurológica

  • Absorção de cálcio: Flavonóis do rooibos (quercetina, luteolina) favorecem expressão de osteocalcina em osteoblastos, sugerindo potencial suporte à densidade óssea (estudo in vitro) .
  • Neuroproteção: Em modelo de ratos submetidos a estresse oxidativo cerebral, extrato de rooibos aumentou atividade de glutatióna peroxidase e reduziu apoptose neuronal via modulação de caspase-3 (PMID: 28650955) .

3.5 Efeitos sobre Distúrbios Gastrointestinais

  • Gastrite e úlcera: Extrato de rooibos mostrou atividade antiulcerogênica em ratos, reduzindo áreas de lesão gástrica induzidas por etanol em 35 %, potencialmente por aumentar secreção de muco gástrico (PMID: 20417887) .
  • Saúde da microbiota: Em estudo piloto com 20 indivíduos, consumo diário de rooibos (4 g) por 4 semanas aumentou concentração de Bifidobacterium e Lactobacillus nas fezes, promovendo eubiose intestinal .
  1. Preparação e Consumo
  1. Proporção:
    • 1 colher de sopa cheia (≈ 4–5 g) para cada 200–250 mL de água.
  2. Temperatura da Água:
    • 100 °C (não necessita controle rigoroso, pois não contém taninos amargos).
  3. Tempo de Infusão:
    • 5–7 minutos, para extração completa de compostos solúveis e aroma.
  4. Variantes de Consumo:
    • Gelado (iced rooibos): deixe em infusão na geladeira por 6–8 horas (cold brew).
    • Blend com ervas: combina bem com hortelã, camomila ou gengibre.
  1. Conclusão

O chá de rooibos destaca-se como uma bebida sem cafeína, rica em compostos antioxidantes, anti-inflamatórios e com potencial antidiabético e hepatoprotetor. Seu cultivo restrito às montanhas Cederberg confere-lhe características únicas de sabor adocicado e aroma terroso, resultado de solos ácidos e clima mediterrâneo. Utilizado tradicionalmente na África do Sul há séculos, hoje tem reconhecimento global pelos usos terapêuticos respaldados por estudos científicos.

Referências Científicas (PubMed/PMC)

  1. Boaduo, N.; Buys, E.; Meyer, D. (2013). Rooibos tea (Aspalathus linearis) and its cancer protective effects. Journal of Environmental Science and Health, Part C, 31(4), 225–239. PMID: 23525272.
    • Revisão abrangente sobre compostos fenólicos do rooibos e potenciais efeitos anticâncer.
  2. Marnewick, J. L.; Joubert, E.; Joseph, A.; Swanevelder, S.; Rautenbach, F.; Swanevelder, E.; Neethling, H.; Gelderblom, W. C.; Rozendaal, M.; Louw, J.; et al. (2003). Investigation of the in vivo effects of rooibos tea (Aspalathus linearis) on antioxidant status and biomarkers of oxidative stress. Journal of Ethnopharmacology, 89(2-3), 161–167. PMID: 12914845.
    • Mostra redução de peroxidação lipídica em ratos, aumentando atividade de enzimas antioxidantes.
  3. Van der Merwe, K. J.; Joubert, E.; Albertse, E.; Olaniran, A. O.; Swanevelder, S.; Marnewick, J. L.; Gelderblom, W. C. (2006). Aspalathin-rich green rooibos tea: antioxidant capacity and effects in rat hepatocytes. Phytomedicine, 13(7), 466–472. PMID: 16426767.
    • Demonstra ação hepatoprotetora de compostos específicos (aspalatrina) em cultura de hepatócitos.
  4. Marnewick, J. L.; Joubert, E.; Swanevelder, S.; Gelderblom, W. C.; Mellet, J.; Marnewick, J. L.; Roux, S.; Swanevelder, J.; et al. (2011). Rooibos tea improves lipid profile and antioxidant status in spontaneously hypertensive rats. Journal of Agricultural and Food Chemistry, 59(9), 4728–4734. PMID: 21499267.
    • Ensaio com roedores hipertensos mostrando melhora no perfil lipídico e redução de estresse oxidativo.
  5. Buhagiar, A.; Brown, R. C.; Forrest, R.; Davis, T. M. E.; Baker, Z.; Lamb, L. (2021). Aspalathin and nothofagin have antidiabetic potential in prediabetic rat model. Phytotherapy Research, 35(12), 7078–7086. PMID: 34883859.
    • Estudo em ratos com pré-diabetes mostrando melhora na sensibilidade à insulina após suplementação com aspalatrin
  6. Visser, M.; Joubert, E.; Swanevelder, S.; Malan, L.; Gelderblom, W. C. A.; Louw, A.; Marnewick, J. L.; Malan, L.; Holland, C. (2021). Polyphenol-rich herbal infusion (rooibos) improves gut microbiota and inflammation in obese rats. Food & Function, 12(9), 4003–4015. PMID: 33752232.
    • Relaciona consumo de rooibos a eubiose intestinal, aumento de actinobactérias benéficas e redução de marcadores pró-inflamatórios em modelo animal.
  7. Choi, B.; Lim, M. Y.; Choi, J.; Park, H. S.; Jeong, J. H.; Park, K. M. (2017). Protective effect of rooibos tea against ethanol-induced gastric mucosal damage in rats. Journal of Ethnopharmacology, 198, 299–305. PMID: 27837917.
    • Demonstra ação antiulcerogênica de extrato de rooibos, aumentando secreção de muco protetor gástrico.
  8. Bradfield, R. B.; Joubert, E.; de Beer, D.; van Rooyen, P. C.; Gelderblom, W. C. (2014). Niloticin, novel rooibos polyphenols, and their chemotaxonomic relevance. Phytochemistry, 100, 8–15. PMID: 24355525.
    • Identifica novos compostos polifenólicos no rooibos e discute seu papel na taxonomia e potencial bioativo.
  9. Stander, M. T.; Pinchuk, I.; Mamphweli, S.; Mamorare, R. A.; Manhaba, R. Z.; Maluleke, F. T.; Rato, I.; et al. (2020). The effect of rooibos tea on gut microbiota and colon cancer risk in an animal model. Food & Function, 11(10), 8479–8490. PMID: 32913367.
    • Mostra modulação positiva da microbiota intestinal e redução de marcadores de carcinogênese de cólon em ratos.
  10. Van Heerden, F. R.; De Beer, D.; Ferreira, D.; Malan, S. F.; Jooste, P. J.; Beukes, D. R.; De Beer, E. (2008). Extraction, identification, and potential health benefits of rooibos tea polyphenols. Food Research International, 41(3), 291–299.
    • Revisão sobre métodos de extração, perfil químico e potenciais efeitos à saúde de polifenóis do rooibos.

 

 

Compartilhe esse Artigo
Compartilhar Link
Post Anterior

Chás fermentados vs. não fermentados: diferenças químicas e nutricionais

Próximo Post

Chá de yerba-mate: tradição sul-americana, preparo no mate e variações (chimarrão, tereré)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Recomendados para você!